Viagem ao Gerês
VIAGEM AO GERÊS
“Deus criou o homem à sua imagem e semelhança”. Assim é o nosso Deus, o Deus judaico-cristão. Os outros Deuses, os da Grécia ou os de Roma, são feitos à semelhança dos homens: tem paixões, preferências, são vingativos e são magnânimos, interferem com o destino dos homens.
A nossa viagem correu deliciosamente, sob o signo do humano. O sol apareceu e iluminou a natureza deixando que as cores de Outono encandeassem o olhar.
Em Ceide, o verde do chão e do “tecto”, das árvores, enquadra o Centro de Estudos Camilianos. Apreciamos a escala: como mercê da sábia manipulação dos volumes, da variação do pé-direito e da organização e dimensionamento do programa, se transforma um edifício, relativamente pequeno, num “monumento” de grande dignidade. Como Camilo, profícuo escritor, vê expressada a sua humanidade no edifício e no seu conteúdo. Disso é exemplo a pequena exposição sobre as suas mulheres, onde os suportes escolhidos, por natureza excessivos, resultam numa eloquente descrição expositiva. Do outro lado o centro paroquial fervilhava de vida em véspera da bênção. Deixa vontade de lá voltar.
O Gerês é esplendoroso, também nesta época do ano. O percurso a pé até à casa de Adpropeixe, desenhada por Carlos Castanheira, foi disso testemunho. Ela aparece, quando seguimos este caminho de acesso não convencional, de surpresa. Vêmo-la de baixo, mas desde logo cativa. Palafita, descontraída, que se constrói na ânsia de ver mais alto e mais longe. Talvez para ficar perto daqueles deuses preguiçosos, que sabem usufruir das vantagens do vício humano. Assim se mostra, acolhedora, convidando ao ócio do corpo e da mente. Carlos Castanheira “ tomando a parte pelo todo” constrói um abrigo, de madeira e explora sem medo ou preconceito as suas potencialidades. O importante é desfrutar sem obstáculos a paisagem quase imaculada. Os donos estavam lá simplesmente e acolheram com assinalável simpatia os 47 intrusos que profanaram o seu “templo”.
A subida e descida da serra para depois voltar a subir para Brufe, a fome e o cansaço, não nos impediram de ver a paisagem, onde a construção do homem, na fabricação da terra deixa marcas, que fazem dele um bicho natural. Aqui a marca do homem é paisagem e já é pura natureza. Por isso o restaurante não podia ser diferente, como também não é indiferente. Discreto, voltado ao vale que se abre, respira paz, que lhe é conferida pela percepção da sua exacta posição geográfica e conceptual: a vista é a sua razão, o “sitio” o seu princípio e o seu fim.
No regresso, breve sob o signo da conversa amena, Manuel Maria Reis e Carlos Castanheira dispuseram-se a partilhar connosco as suas dúvidas, as suas angústias mas sobretudo o sublime prazer de construir, deste modo, de homem para homem, desafiando os deuses. A Cultour encontra o seu sentido.
Álbum da visita